sexta-feira, 15 de maio de 2009

Os Monstros – Textos e Pretextos, Primavera/Verão 2006, nº 8

Há cinco anos atrás, o filme Monsters Inc., realizado por Peter Doctor, invadia as salas de cinema, lotadas por um público muito jovem, ou nem tanto. A campanha de marketing mobilizou os consumidores que compraram, em grande escala, pequenas réplicas do monstro azul e felpudo, protagonista do filme. Na história, este monstro detinha o record de sustos de Monstropolis, uma cidade cuja energia era obtida a partir dos gritos das crianças. Todo os outros monstros visitavam o mundo através de portas especiais que comunicavam com os armários dos quartos dos miúdos.

A este exemplo somam-se tantas outras personagens cinematográficas que fazem parte do nosso imaginário: Frankenstein, X-Men, Hannibal Lecter, o simpático Shrek ou uma extensa lista de seres mutantes da Marvel. Em Homero, Rabelais, Mary Shelley, Kafka, entre tantos outros, na Literatura, na BD, nas Artes Plásticas, no Teatro e na Dança, os monstros vão-se acumulando e permitem-nos quase falar de uma ‘monstruosidade banalizada’. E se foram inúmeros os monstros imaginários na Antiguidade, ou os monstros de uma memória colectiva – quem poderá esquecer o Adamastor? – somos ainda invadidos por outros tipos de monstros bem diferentes, por exemplo, em freak shows: anões e gigantes, homens-mosca, homens-rã, homens-porc, verdadeiras aberrações que questionam a nossa identidade e se transformam, elas próprias, numa identidade indefinida.

Hoje somos confundidos pela velocidade do que nos rodeia e que nos dá a sensaçao de estarmos quase sempre atrasados. Questionamo-nos por isso sobre o que é ser e ter um corpo e de que forma podemos afirmar a nossa singularidade. E nesta permanente busca os monstros encantam-nos e perturbam-nos.

Por que nos fascinam então tanto os monstros? E o que determina a definição de um monstro como tal? Um rosto sem boca? Quatro olhos em vez de dois? Uma função orgânica anormal? Ou será o monstro também aquele que, invariavelmente, nos habita e que tentamos a todo o custo adormecer?

Margarida Gil dos Reis